sexta-feira, fevereiro 27, 2004

Singularidades de uma rapariga loura 21 - Felino

o pelo macio e brilhante
o focinho cor-de-rosa
os bigodes e os olhos amendoados
a expressão: "que é que estás a fazer?"
a curiosidade e a elasticidade
a espreguiçadela matinal
os ronrons e as turrinhas
a elegância do teu caminhar
a pose de dono do território
a tua alegria quando chego a casa
não há stress que resista a isto...

"Me alimentaram
Me acariciaram
Me aliciaram
Me acostumaram

O meu mundo era o apartamento
De tefon, almofada e trato
Todo dia filé-mignon
Ou mesmo um bom filé... de gato
Me diziam em casa, não tome vento
Mas é duro ficar na sua
Quando à luz da lua
Tantos gatos pela rua
Toda a noite vão cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora ou senhorio
Felino, não reconhecerás

De manhã eu voltei pra casa
Fui barrada na portaria
Sem filé e sem almofada
Por causa da cantoria
Mas agora o meu dia-a-dia
É no meio da gataria
Pela rua virando lata
Eu sou mais eu, mais gata
Numa louca serenata
Que de noite sai cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora ou senhorio
Felino, não reconhecerás"

História de uma gata - 1977
Enriquez - Bardotti - Letra: Chico Buarque